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[Espanhol] Cuando Galeano entrevistó a un preso anarquista recién fugado…

Retirado de:                                                                 https://ccsubversion.wordpress.com/2015/04/17/cuando-galeano-entrevisto-a-un-preso-anarquista-recien-fugado/

Sin título 3

A raíz de la muerte de Eduardo Galeano se nos viene muchas imágenes de él, de sus palabras, de sus versos, a nuestra mente. Hoy queremos recordarlo con esta entrevista que le realizó al compañero Alberto “Pocho” Mechoso, militante de la Federación Anarquista Uruguaya y de su brazo armado Organización Popular Revolucionaria 33 Orientales, quién se encontraba preso en los años 70 y logro escapar de la cárcel después de varias torturas hechas por los servicios de inteligencia, lo que demuestra una vez más que la pluma de Galeano siempre estuvo dispuesta como una espada para las luchas de los pueblos, así, la tarea de entrevistar a Pocho Mechoso la asumió Eduardo con la altura que se requiere, con el dolor de ver la represión expandirse en Uruguay y con la convicción de que una salida revolucionaria y antiautoritaria era necesaria.

Teniendo las precauciones de seguridad debidas a la cruel represión del gobierno, Galeano se cambia el nombre y afirma realizar la entrevista en España, aún cuando fue realizada en Uruguay, para que la policía pensará que Pocho Mechoso había ya salido del país y así poder descansar un poco frente a ello.

No sobra recordar también al compañero Alberto Mechoso, quién posteriormente huyó a Argentina, cuyo paradero sería hallado por la dictadura del país gaucho el 26 de septiembre de 1976, quienes le desaparecieron. Sus restos fueron encontrados en diciembre del 2012.

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El reportaje después de la fuga:

El reportaje de Eduardo Galeano  a Pocho Mechoso comienza diciendo:  “El Pastor Georges Casalis, profesor  de la Facultad de Teología Protestante  de París, acaba de denunciar “la evolución fascista de los países del Río de  la Plata…Refiriéndose al Uruguay…  es el horror austral. Parece que se ha  alcanzado el fondo del abismo.  Nos dice después Galeano: “Hemos entrevistado a un hombre que  emergió del fondo del abismo y relata  lo que sufrió y vio… Huyó del cuartel el 21 de noviembre, en una acción  espectacular… Aún orina sangre, no  ha recuperado la sensibilidad de la  mano derecha y dos de sus costillas  han quedado hundidas por los puntapiés que le propinaron los oficiales.  Tiene prisa sin embargo por retornar  al Uruguay. “Vuelvo para incorporarme a la lucha”, nos dice. “La pelea se  da tanto dentro del cuartel, en la tortura, como fuera, en la calle…”.

Pregunta Galeano: ¿Fuiste torturado desde el principio?.

Pocho: Sí… querían que les dijera donde estaba la Bandera de los 33 (una bandera insignia en Uruguay, recuperada por la guerrilla anarquista), que la  OPR se llevó del Museo Histórico Nacional. También querían que les hablara del secuestro de Molaguero…”.

Pregunta Galeano: “¿Pero si no  habías hablado, era preciso que te  fugaras?.

P. No me iban a dejar salir en libertad. Yo lo sabía. Ponerme en libertad era como dejar clara su impotencia, el fracaso de sus métodos.

G. ¿Que viste?.

P. Bueno, más que ver escuché. Porque estuve encapuchado todo el tiempo. Pero no hay peor tortura que sentir como torturan a los demás. En el  Quinto de Artillería tenían a un niño  de seis años encerrado junto a su padre y a su madre. El niño escuchaba  los alaridos de la madre cuando la  estaban torturando. A una mujer embarazada de siete meses, le torturaban a su marido delante de ella en el  2 y 3 de Infantería… varios casos de  violaciones…

G. ¿Y ahora qué?.
P. Cuando uno ve  bien claro cómo son los  enemigos, ¿Qué otra cosa  puede hacer que volver y  ocupar su puesto?. Si algo  se siente bien adentro en  el submundo de los cuarteles de mi país, en medio  de la picana, del caballete,  del submarino, es de qué  lado de la trinchera siempre hay que estar. Yo voy a  estar de nuevo metido entre la gente  Un referente de Lucha  de mi clase. Peleando. Allí me voy a  reencontrar con mis hijos, junto con  mi hermano. Ahora perseguidos los  dos.

G. ¿Pero después de la fuga, te  andarán buscando por todos lados, te  será muy difícil estar en Uruguay?.

P. Eso está claro. El momento  es muy difícil para todos los que luchan. Sé que para mí es cosa de “Libertad o Muerte” como dice la Bandera de los 33”.

Alberto “Pocho” Mechoso, PRESENTE!

Os restos mortais de Alberto “Pocho” Mechoso foram encontrados nessa quarta-feira, dia 23 de maio. Fundador da Federação Anarquista Uruguaia (FAU), organização anarquista especifista, “Pocho” também foi sindicalista na Federação dos Operários da Carne e militante ativo da Organização Popular Revolucionária 33 Orientais (OPR-33), braço armado da FAU que dava apoio a greves e realizava sequestros de patrões e expropriações para financiar a luta.

Em seus últimos anos de vida, “Pocho” militou no Partido Pela Vitória Popular (PVP), organização que dissolveu a FAU dentro de si. “Pocho” se manteve junto a outros companheiros da FAU dentro do PVP com a intenção de refundar a organização especifista. Preso em Buenos Aires em 26 de setembro de 1976, seu corpo foi encontrado com outros sete no fundo do mar, dentro de barris com cimento.  Relembramos esse companheiro que mesmo sem termos conhecido é muito querido por nós. Seu exemplo militante estará presente em nossa luta, hoje e sempre.

Libertad o muerte!
Ni olvido, ni perdon!
Hasta siempre, Pocho!
Arriba los que luchan!

Bruno, OASL

Reproduzimos abaixo a tradução de um fragmento do livro “Ação Direta Anarquista: Uma História da FAU” e de uma carta escrita por “Pocho” antes de sua fuga para a Argentina.

Alberto “Pocho” Mechoso – Fragmento tirado do livro “Ação Direta Anarquista: Uma história da FAU”ALBERTO “POCHO” MECHOSO, ANARQUISTA E EXPROPRIADOR

Nasceu em Trinidad, no departamento de Flores. Ali fez seus dois primeiros anos de escola, que continuaria depois em Montevidéu. Não conseguiu terminar o primário. De família de trabalhadores que tinham renda insuficiente, aprendeu a compartilhar as dificuldades com seus quatro irmãos.

A família, cansada de uma situação que não oferecia possibilidade alguma de melhora, emigrou para Montevidéu. Era questão de tentar a sorte, como tantos vizinhos que já haviam partido para esta aventura. A rua Ansina, no bairro Palermo, foi onde fez suas primeiras amizades montevideanas e imediatamente formou uma turma de amigos. O beiral da Escola da rua Gaboto foi testemunha de alguns castigos que sofreu por responder aos professores. Era rápido e agudo para questionar sobre as coisas que considerava erradas.

La Teja e o Cerro foram os bairros que o viram crescer. Três irmãos se tornaram anarquistas e em sua casa o libertário passou a ser tema de todos os dias. Perguntava, tinha simpatia, seu espírito rebelde o aproximava dessa ideologia que reclamava justiça para os pobres e que não a pedia de joelhos.

Mais adiante trabalhou na Indústria da carne e durante uma longa greve acabou demitido. Foi então feirante por um tempo junto com alguns de seus irmãos. Não existia a FAU ainda, havia sim uma Agrupação Anarquista Cerro-La Teja e o Ateneu Livre também Cerro-La Teja. Começou a militar na Juventude do Ateneu.

Corria já mais da metade da década de 1950, nesse momento o trabalho era escasso. A crise econômica já começava a golpear forte aos lares operários. Com um grupo de jovens como ele, amigos entre si e quase todos simpatizantes libertários, começaram a falar de finanças para montar uma cooperativa de trabalho e doar uma parte para a reluzente FAU. Finalmente decidiram expropriar um Banco do Paso del Molino: La Caja Obrera.

Foi um trabalho cuidadoso, estudado em seus detalhes. Encontraram uma quantidade de dinheiro maior do que a esperada. Fizeram a doação e deixaram o resto para o objetivo acordado. Foi este, por acaso, o primeiro Banco expropriado no Uruguai.

Um ano depois acabou preso vinculado a tal episódio.

Ficou seis anos detido: em Miguelete e Punta Carretas. Lia muito na prisão, por exemplo: “Nacionalismo e Cultura” de Rocker, “Vida e pensamento de Malatesta” de Luiggi Fabbri, “A Revolução” de Landeur, romances. Em um pacote, semanalmente recebia pelo menos um livro.

“- Como são esses guerrilheiros, eles seguirão a fundo?”, perguntava em uma visita em meados de 1959. Acompanhava com grande interesse o processo cubano.

Saiu da prisão com mais formação política e imediatamente tomou contato com a FAU. Iniciaram-se conversas para definir seu posto de militância. Mauricio (Gatti) foi o primeiro a pensar que haveria que incorporá-lo em atividades do tipo armado.

“Pocho” tinha reflexos rápidos, bom trato para acomodar as pessoas, jovial, rebelde e determinado, tudo isso o fazia uma pessoa singular. Gostava das piadas, brincava com questões sérias, fazia piadas sobre si mesmo e a militância engajada. Mas isto era acompanhado de uma profunda fé no que fazia e de respeito verdadeiro pelo trabalho. Era bom nas operações mas não subestimava nada, sempre queria analisar bem os detalhes.

Finalmente, foi, na formação da OPR, uma peça fundamental em todo o trabalho organizativo e também em estimular confiança nos companheiros que estavam começando. Aqui verteu sua experiência e sua decisão. Integrou, como encarregado, a primeira equipe operativa quando se resolveu encarar a atividade armada de forma específica e continuada. Realizou no princípio, com sua equipe precursora, expropriações bancárias decididas pela Organização e que foram vitais para o desenvolvimento dos projetos em curso. Depois atuou em diversas operações, entre elas a retenção de burgueses.

Formou parte da Aguilar [*] e sua experiência e firmeza foram contribuições inestimáveis neste organismo que tinha a responsabilidade da ação armada da Organização.

Caiu preso, foi selvagemente torturado, resistiu com integridade pouco comum e sozinho protagonizou uma fuga espetacular de um quartel. Recuperou-se de cortes nas mãos e das costelas quebradas e, por decisão da FAU, mudou-se para a Argentina. Ali se reintegrou imediatamente às atividades.

Capturado, sofreu novamente torturas no Pozo de Orletti [prisão clandestina]. Hoje é um dos companheiros que figura como desaparecido. Pocho, seu apelido público, ou Martín, seu nome de batalha, manteve sempre seus costumes, sua cultura de bom homem do povo. Menino do bairro, na boa rua, autodidata, leitor, modesto e com um profundo sentimento de pertencimento aos de baixo, deixou uma marca indelével.

Sabemos que (ele compartilhou disso completamente) não são as pessoas por si só que produzem o desenvolvimento e permanência de uma Organização. É uma quantidade de esforços de muita gente que produz algo fecundo. É nesse contexto que apontamos esta contribuição militante. No entanto, é certo que no marco deste conjunto imprescindível há companheiros com contribuições excepcionais. “Pocho” e “Santa Romero”, sem dúvida, foram exemplo disso.

[*] A OPR-33 se organizava em “células” ou equipes de 3 ou 6 pessoas, duas ou três das quais se uniam pra formar unidades de trabalho (operativa, de serviços ou de informação). Aguilar era o corpo responsável por articular essas unidades. (NT)

Texto original em: http://federacionanarquistauruguaya.com.uy/2012/05/24/alberto-pocho-mechoso-fragmento-tomado-del-libro-accion-directa-anarquista-una-historia-de-fau/

Tradução: Khaled, Coletivo Anarquista Bandeira Negra

Alberto “Pocho” Mechoso – Hoje e sempre – Viva os que lutam!!!
 
Alberto Mechoso Méndez (Pocho)
1936-1976

Esta carta foi escrita após sua estada na 5ª sede da Artilharia, quartel localizado ao lado do Cemitério Norte, do qual fugiu. “Pocho” desapareceu na Argentina como militante da FAU no interior do mar de militantes que foi o PVP de 1976.

Companheiros:

Desde 6 de agosto até agora, eu acho que aprendi mais, muito mais do que me ensinaram os 6 anos que passei em Punta Carretas; me parece que aprendi muito mais que nos 35 anos que tenho de vida. Por um lado está a experiência de dentro do Quartel, o enfrentamento aos carrascos, as mãos solidárias dos companheiros. Por outro lado o que passou depois, do lado de fora. Na noite seguinte à fuga me vi na televisão.

Me requeriam por “estar vinculado a…” e em nenhum lado uma só linha do que realmente havia passado. Depois novas listas de exigências. Uma delas era encabeçada por minha companheira. Me informei que a casa onde vivia com minha mãe, com minha companheira e meus filhos estava fechada, em custódia das Forças Conjuntas. Me informei que um militar com várias patentes disse que essa casa só seria devolvida se eu me entregasse.

E tudo isto que eu vivo tão intensamente, o estão vivendo, de um modo ou outro, centenas de milhares de orientais [uruguaios]. São muitos os pequenos separados de seus pais porque estão presos ou porque precisam ir a outros lados buscar o trabalho que aqui não encontram. São muitas as mães que não veem seus filhos porque estão sendo perseguidas ou porque trabalham de sol a sol para ajudar a encher a panela. São muitas as mulheres que ao final de uma vida de trabalho não têm um teto onde abrigar-se, porque não podem pagar com suas aposentadorias miseráveis ou porque a mente podre dos carrascos vinga sobre elas a rebeldia dos filhos que com imenso carinho elas souberam criar.

E ante tudo isto, que outro caminho nos resta? Ante tudo isto, de que maneira vale a pena viver a vida?

Há um só caminho, há uma só maneira de viver sem sentir vergonha: lutando. Ajudando para que a rebeldia se estenda por todos os lados, ajudando para que se unam o perseguido e o homem sem trabalho, ajudando para que o “sedicioso” e o operário explorado se reconheçam como companheiros, aprendam lutando que têm à frente um inimigo comum. Por tudo isso, companheiros, quero que me guardem um lugar… por tudo isso não vou tardar em voltar. Liberdade ou Morte.

“Pocho”

Texto original em:

http://federacionanarquistauruguaya.com.uy/2012/05/23/alberto-pocho-mechoso-hoy-y-siempre-arriba-los-que-luchan/

Tradução: Khaled, Coletivo Anarquista Bandeira Negra

Retirado da página:

http://www.vermelhoenegro.co.cc/2012/05/alberto-pocho-mechoso-presente.html

[CAB] Um pouco de nossa concepção de anarquismo: desmistificando estereótipos e esclarecendo equívocos

Em Julho do presente ano foi realizado o 1º Congresso da Coordenação Anarquista Brasileira (ConCAB), no marco de 10 anos de construção de um Anarquismo organizado especificamente e inserido nas lutas de nosso povo. O Fórum do Anarquismo Organizado (FAO), instância que ao longo dessa década reuniu diversas Organizações Anarquistas Especifistas de todo o Brasil para discutir temas que permitissem o necessário acúmulo e os indispensáveis acordos para que pudéssemos avançar na tarefa de construção de uma Organização Anarquista a nível Nacional, cumpriu sua função inicial e, desde o 1º CONCAB, deixou de ser um Fórum para se tornar uma Coordenação. Uma nova etapa foi, portanto, aberta para a militância especifista brasileira: constituir um espaço de coordenação em que participam 9 Organizações Anarquistas de diferentes Estados, de base Federalista e que vá construindo – a partir de práticas concretas e na medida em que vai ampliando sua base de acordos – unidade estratégica e maior organicidade para intensificar a inserção social no seio de nosso povo. Nesse sentido, são mais de 10 anos de resgate do Anarquismo enquanto corrente libertária do Socialismo, organizada politicamente e inserida socialmente. É o resgate da já antiga mas atualíssima máxima que diz que a “emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”, porém aliada também a histórica prática da organização do anarquismo enquanto partido, como foi a Aliança da Democracia Socialista de parte da Ala Federalista e Anti-autoritária da 1ª Internacional (Bakunin, Guillaume, Malatesta, Cafiero e outros) e também da nossa irmã Federação Anarquista Uruguaia, que se manteve atuante no período da ditadura militar uruguaia, mantendo inserção social operária, estudantil e organizando um aparato armado que combateu o regime sanguinário que manchou de sangue nossa América Latina.

No entanto, nossa rica história que se confunde com a história da classe trabalhadora é muitas vezes atacada ou desmerecida: muitas vezes trata-se do simples desconhecimento ou a reprodução de discursos simplificadores e reducionistas, porém, muitas vezes se trata da má fé, do preconceito e da necessidade de construção política na base da calúnia, auto-promoção e mentiras. Recentemente, o último texto que tivemos contato e que faz referência aos “anarquistas” nestes moldes é uma nota lançada pelo PSTU de Curitiba, intitulada “Nossas diferenças com a corrente Luta Socialista (LS)/Outros Outubros Virão”, na qual é analisado a postura desse grupo citado no título da nota nas eleições ao DCE da UFPR e junto a eles o Coletivo Quebrando Muros (que possui militância anarquista do Coletivo Anarquista Luta de Classes – CALC, organização integrante da CAB). Independente do que motiva este e outros discursos, julgamos conveniente vir a público para dar nossa posição sobre o estereótipo do “anarquista” mais uma vez reproduzido à custa da verdade. Assim, nos posicionamos nacionalmente não para entrarmos na briga de quem é mais revolucionário ou possui a verdadeira interpretação do período em que vivemos, mas sim porque julgamos necessário esclarecer o que consideramos equívocos, desconhecimentos e incoerências.Nossa implicação enquanto CAB se dá por um conjunto de motivos que normalmente são veiculados em materiais como o que nos referimos acima: generalização e estereotipação do anarquismo; acusação de que somos uma seita esquerdista e que não teríamos nenhuma responsabilidade; de que somos anti-partidários; de que seriamos sectários e intransigentes, possuidores, portanto, da difamação e do ataque como única forma de construção militante possível; que fazemos alianças somente com quem pensa da mesma forma que nós; que possuimos em nossa história apenas o anarco-sindicalismo como expressão política e organizativa e, ainda mais, que atacamos toda e qualquer entidade sindical, estudantil e popular como sendo burocrática e desnecessária à luta. Também assinalam normalmente que hoje nós, “seita anarquista”, estaríamos limitados em geral a seitas estudantis mais ou menos marginais e sem inserção real na classe trabalhadora. Daremos nossa posição sobre tudo que até agora reproduzimos.Primeiramente, nós Coordenação Anarquista Brasileira fazemos parte de uma tradição político-organizativa chamada de Especifismo. Especifismo porque fazemos a defesa enquanto Anarquistas da necessidade de nos organizarmos politicamente enquanto tais. Essa necessidade se expressa por meio de uma Organização Política Anarquista, Federalista e de Quadros, com critérios de ingresso, formação militante, dotada de um Programa Mínimo, Estratégia de Curto e Longo Prazo e Objetivo Finalista. Não somos, portanto, uma seita. Somos sim, no interior da história do Socialismo, um Partido, tal como dizia o italiano Errico Malatesta:

“Nós, os socialistas-anarquistas, existimos como partido separado, como programa substancialmente constante, desde 1867, quando Bakunin fundou a Aliança; e fomos nós os fundadores e a alma do rumo antiautoritário da ‘Associação Internacional dos Trabalhadores.”

O Especifismo tem sua expressão “inicial” na América Latina com a FAU (Federação Anarquista Uruguaia), fundada em 1956 e que reuniu em sua formação velhos militantes anarco-sindicalistas que se organizavam na FORU (Federación Obrera Regional Uruguaia); velhos combatentes da Revolução Espanhola; jovens militantes sindicais e estudantis do país e alguns remanescentes que conviveram com o grupo de anarquistas expropriadores que realizaram diversas ações na região do Rio da Prata. A FAU era defensora da organização especifica do Anarquismo, por meio de uma Estrutura Organizacional que vinculasse organicamente seus militantes sob uma Declaração de Princípios e Elementos de Estratégia e que pudesse desenvolver em seu interior tarefas correspondentes a análises de conjuntura, capacitação político-militar (projetando ai o desenvolvimento de um aparato armado que se concretizou e foi chamado de OPR-33 – Organización Popular Revolucionária 33 Orientales) e é claro, inserção social no movimento de massas. A FAU ao longo de sua existência (se mantém atuante ainda hoje) cumpriu importante papel na construção da CNT (Convención Nacional de Trabajadores), participando através de sindicatos de base ou da própria direção da entidade; na construção da ROE (Resistência Obreiro Estudiantil), agrupação de Tendência que reuniu boa parte da militância de base classista e combativa (anarquistas, marxistas, leninistas, etc.) que se opunham a direção do PCU que era majoritário no movimento popular; e desenvolveu, num primeiro momento junto ao MLN-T (através da Coordinadora) e depois por um trabalho próprio, ações de expropriação de bancos, seqüestros de patrões e figuras ligadas à ditadura e apoios às mobilizações populares. Nós da CAB compartilhamos dessa tradição porque foi através dela que no início dos anos 90, quando do debate de reorganização do anarquismo, se iniciou a construção de Organizações Específicas Anarquistas que até hoje trabalham para seu crescimento e maior inserção. Portanto, não somos Anarco-Sindicalistas ou Anarco-Estudantis, porque não fazemos a defesa de sindicatos ou entidades estudantis anarquistas, mas sim da necessidade de nos organizarmos politicamente para intervirmos no Movimento Sindical e Estudantil.

Dessa forma, não somos contrários à existência de entidades “representativas”, sejam elas locais, estaduais ou nacionais, assim como não somos, por princípios, contrários à disputa das direções. No entanto, não temos como calculo político apenas a suposta exigibilidade da luta de classes da disputa das direções dos Movimentos para que eles sejam de fato revolucionárias, porque não apostamos nossas fichas de que a direção (o sentido) de um determinado movimento social seja resultado direto do grupo político que o dirige. Não negamos a influência que este grupo possa exercer, mas não fazemos dela a condição para o sucesso das lutas. Se somos partidários de uma proposta combativa, achamos sim necessário uma Organização Política preparada para intervir e dar conta de certas tarefas que os Movimentos Populares não poderiam dar conta, não achamos, porém, que esta Organização seja uma Vanguarda ou Direção Revolucionária porque mais capacitada para sintetizar os desejos da classe num socialismo pretensamente “científico”. Por isso, em nossa percepção, a disputa de entidades está condicionada a capacidade que possuímos de intervenção e de fomento da organização das Classes Oprimidas, papel que estas entidades devem cumprir, assim como a própria análise do cenário vivido em cada Frente Social. Caso contrário, a ocupação de uma entidade torna-se apenas um rito burocrático que não dá protagonismo a nossa classe e tampouco acumula força social para um projeto radical.Dessa forma, não somos espontaneístas, achando que a organização popular virá por ela mesma. Ao contrário do que alguns dizem, seguimos contribuindo com o fortalecimento dessa organização, com esforços modestos mas firmes, no movimento popular, sindical, estudantil e rural em diversos estados deste país. Apostamos na necessidade de uma Organização Política trabalhar consciente e intencionalmente no desenvolvimento da participação e organização popular, seja ela sindical, estudantil, comunitária etc., mas sempre considerando que o decisivo para as lutas, para o acúmulo necessário a um sentido revolucionário que realmente coloque em xeque o sistema de dominação capitalista —  e o Estado enquanto peça fundamental desse sistema de dominação  —  é a Força Social expressa na Organização das Classes Oprimidas através de seus próprios instrumentos de organização, de defesa e de ataque dos nossos inimigos de classe. Nossa concepção, historicamente tem se confrontado com a ideologia do Socialismo Estatista, justamente por acreditar que a destruição do Estado depende do avanço da organização das classes oprimidas e da forja de um sujeito revolucionário que aponte nesse sentido.

“Os velhos socialistas falavam de construir uma nova civilização. Durruti disse que levamos um mundo novo em nossos corações. Fazem alusão a valores, a uma nova forma de vida, de novas relações sociais. Se algo ensina a história é que isto não se produz de cima, requer construir um novo sujeito social. E para esta construção é fundamental a participação ativa, transformadora desse sujeito. Se não tem tomado contato com novas, ainda que sejam incipientes relações sociais, esse sujeito social não pode ter outros referentes que os conhecidos e os que tende a reproduzir. É construindo força social e tomando ativa participação nela que se podem formar embriões da nova civilização ou do “homem novo”, de outro sujeito. Digamos que este é o tema de como se transforma a consciência, para usar a linguagem clássica. Pelo que tem se visto a economia por si não transforma a consciência. O que o sujeito vive e como vive cotidianamente, historicamente, no marco de determinados dispositivos, seria o elemento principal de mudança de sua consciência.”“Outro sujeito histórico não virá do nada, não aparecerá como arte de magia, deve ser o fruto de práticas que internalizem outras questões que chocam com o dominante. A participação efetiva, a autogestão, a ação direta, a forma federal de funcionamento realmente democrático, a solidariedade e apoio mútuo, necessitam de mecanismos, organizações, práticas regulares para seu desenvolvimento.”(Documento Teórico Wellington Gallarza e Malvina Tavares – acordo teórico FAU-FAG)

Esse é o nosso objetivo finalista: a construção de uma nova sociedade a partir de um processo revolucionário que destrua o sistema de dominação ao passo que constrói os mecanismos de gestão e de condução política e econômica dessa nova sociedade. Resulta disso nossa defesa do Poder Popular, enquanto um período de transição em meio a um processo revolucionário que consolide novas relações, instituições e mecanismos do próprio povo. Para isso precisamos, hoje, de um Programa Mínimo que faça a mediação entre a realidade vivida tal qual ela é e o nosso Objetivo Finalista. Nas palavras do também italiano Camilo Berneri

“A política é cálculo e criação de forças que realizam a aproximação da realidade ao sistema ideal mediante fórmulas de agitação, de polarização e de sistematização que sejam agitadoras, atraentes e lógicas num dado momento social e político. Um anarquismo atualizado, consciente das suas próprias forças de combatividade e de construção, e das forças adversas, romântico no coração e realista no cérebro, pleno de entusiasmo e capaz de contemporizar, generoso e hábil em condicionar o seu apoio, capaz, em suma, de economizar as suas forças[…]”.

Isso é o Anarquismo para nós da CAB e, por isso escrevemos esse texto de esclarecimento, debate franco e posicionamento político.Temos consciência, enquanto minoria ativa, das inúmeras deficiências e obstáculo que precisamos enfrentar e que enfrentaremos. No entanto, também temos consciência de nossa sinceridade, modéstia e firmeza naquilo que nos propomos. Ao longo desses mais de 10 anos de idas e vindas e de passos dados para amadurecer nosso projeto, temos participado em maior ou menor grau de diversas lutas, construções, embates na América Latina e no Mundo e, independente das divergências com outras tradições do Socialismo exigimos respeito. Estamos juntos e lado a lado na luta pelo Socialismo e pela Liberdade e daí não nos retiraremos.

Saudações Anarquistas e Revolucionárias!

Coordenação Anarquista Brasileira (CAB)

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